19 de out. de 2010

Se tudo que vive é sagrado...


Quando pensei em editar um livro de poesia com a temática sobre morte, não roguei em fazê-lo. Confesso que a idéia, inclusive o nome do título já era algo que martelava e muito dentro de minha cabeça atormentada por produções. Sempre vivi no idílio de me antecipar aos meus fazeres artísticos, pois enquanto eu mal terminava - há exatos dois anos atrás - de lançar o meu primeiro livro de poesia "Orações Licenciosas", já havia formulado no meu íntimo que o meu segundo livro de poesia abordaria as minhas primeiras influências. Essas influências serviram para me impulsionar com mais intensidade e paixão para o mundo da literatura poética. Quando tive contato pela primeira vez com uma oficina de teatro, no Centro Cultural Joaquim Lavora, em São Gonçalo no ano de 1991, eu ainda não tinha nenhuma idéia conceitual artística, apesar de já ensaiar alguns versos no papel, achando estar escrevendo música para uma possível banda de Rock em que eu sonhava em fazer parte. Na bagagem, trazia somente a experiência "clownesca" dos shows de palhaço que fazia com meu pai desde os sete anos de idade.

O teatro me vestiu de novos conceitos. Me trouxe lirismo e uma forma de ver o mundo como antes jamais o enxergava, rompeu com preconceitos que eu trazia na cartilha conservadora de minha família que se dividia entre o catolicismo e a umbanda, quebrou com a minha timidez e me fez um sonhador que jamais suportou ficar parado esperando que o sonho acontecesse. O teatro me apresentou a três figuras que fizeram a poesia se instalar assumidamente em meu dia a dia com paixão e afinco, foram eles: Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud e Dante Alighieri. Dentre os três, identifiquei-me de imediato com a obra As Flores do Mal, de Baudelaire. E foi na colheita dessas flores, impulsionado pela música Rock, que já era também uma outra paixão (tanto que me levou a formar uma banda chamada Divina Comédia posteriormente, mas isso é uma outra história), comecei a dar uma intensidade maior a escrever os meus versos.

A primeira poesia de fato a nascer, traçada por uma caneta esferográfica preta sobre a floha de um caderno, foi Tempo de Um Mortal (pág. 23), pouco antes de ter contato com o teatro, escrita no ano de 1989. Curiosamente, antes mesmo de conhecer poesia de Baudelaire, de uma forma curiosa, o estilo já estava abrigado em mim. O poema mostrou a faceta do questionamento de todo o tédio e dúvidas que me cercavam na época. O escrevi pensando em música, mas como muitos outros, percebi que o que estava nascendo não era um compositor, mas um poeta. 

Com o tempo outras influências fora incidindo em minha escrita, ampliei o conhecimento da poesia maldita e deixei me consumir por Lord Byron, Augusto dos Anjos, Fernando Pessoa e Álvares de Azevedo. Unindo ao estilo byroniano veio ainda a minha paixão pela arte da Contracultura, dos fabulosos Beatniks, que entraram em minha arte como uma luz diáfana pela janela de um quarto escuro. A Beat Generation me libertou da forma ortodoxa de escrever poesia, libertou minha escrita que fluia conforme a inspiração me impulsionava. A morte, no entanto, fora um tema sempre abordado em minha poesia. Na verdade, ainda é. O livro que trago até vocês, vem reunindo uma gama de poemas que venho escrevendo desde a eclosão da arte poética em minha vida, até os últimos dias de edição do mesmo. Foram três meses selecionando, catalogando e editando essa minha novíssima obra, cada poesia fora escolhida e colocada em seu devido lugar e numa devida ordem dentro do livro, no intuito de fazer o leitor viajar através de suas páginas se deleitando com as conecções. Apesar de muitos poemas se distanciarem cronologicamente uns dos outros, será percebido que há uma ligação íntima em cada um.  

Tudo Que Morre é Consumado é meu segundo livro de poesia. A capa a ser escolhida foi uma questão que por algum tempo me assombrou. Quando me deparei com o quadro Shift, da artista plástica britânica Jenny Saville, tive a certeza imediata: seria este o portal para a minha obra. A arte do grotesco expressada por Jenny Saville em suas é sempre expressiva, reflexiva e polêmica. O meu intuito, admito, não foi gerar polêmica ao vestir meu livro com uma capa que trazia a imagem de várias mulheres mortas, foi de inopino que tomei a decisão, foi um impacto visual que me fez dizer: É isso que eu quero! E mesmo titubeando, com a asperação de que talvez não o fosse, nada que vislumbrava se encaixava no lugar. O livro, enfim, em seu conteúdo geral, é uma crítica ao ser humano, que diante de crenças e descrenças, apesar de toda sua vocação intelectual, age como um ser primitivo e destruidor, rogado de ganância e egoísmo. Diante de tudo, ser ateu, teísta ou agnóstico, dúvidas e mais dúvidas sobre o ser e o não ser, a obra nos apresenta de forma nua e crua uma única certeza: a morte. E é isso que o meu livro impõe. Na verdade, um livro sobre a temática de morte que de uma forma ou de outra, nos leva a pensar na própria vida. Pois se tudo que vive é sagrado, tudo que morre é consumado!

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